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Como foi o adeus à Dona Marlene
Walter Falceta

Walter Falceta Jr. é paulistano, jornalista, neto de Michelle Antonio Falcetta, pintor e músico do Bom Retiro que aderiu ao Time do Povo em 1910. É membro do Núcleo de Estudos do Corinthians (NECO).

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Como foi o adeus a Dona Marlene

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Como foi o adeus a Dona Marlene

Adeus: nação corinthiana chora partida de Dona Marlene

Foto: Walter F. Jr.

A noite cinza já caía sobre o Tatuapé, quando salvas de palmas marcaram a última despedida a Dona Marlene, que naquele momento descia ao sepulcro para se juntar a Vicente na trilha da eternidade.

Havia sido um dia de muitas homenagens no velório realizado na Funeral House, na região da Avenida Paulista.

O Time do Povo tem muitos campeões, mas poucos deles compõem a seleta e íntima família corinthianista.

O pranto sobre Marlene veio dos familiares e dos amigos de sempre: Basílio, Wladimir, Geraldão, Vaguinho, Zé Maria, Biro-Biro, além de Adilson Monteiro Alves.

Também presentes companheiros dos Gaviões, como Dentinho e Ernesto. Representando a Fiel também o gentil Cláudio Faria Romero Vila Maria.

Por volta de 16 horas, o cortejo seguiu para a Zona Leste. Pegamos carona com a Leoni, massagista dos Matheus e uma espécie de conselheira informal da ex-presidenta corinthiana.

Enquanto guia pelo trânsito confuso de São Paulo, procurando não se distanciar do carro funerário, ela conta para mim e para o Vila Maria as formidáveis histórias da amiga que partiu.

Certa vez, a caminho do Morumbi, a mandatária corinthiana é identificada no congestionamento por humildes meninos corinthianos. O que eles querem? Ver pela primeira vez o Timão em campo.

Bem, Marlene não sabia dizer não. Entrou numa ruinha estreita e chamou os moleques. Abriu o porta-malas e meteu todos lá dentro.

"Quietinhos aí, se não estou ferrada", adverte. Entra no estádio e logo aparecem os manobristas. "Deixa que a gente leva até a sua vaga, senhora", avisam.

Começa um longo debate. Ela diz que não entrega a chave do carro para ninguém. Os funcionários não estão dispostos a permitir uma quebra no protocolo. Ela insiste. Eles também. Ela bate o pé. E eles finalmente se dão por vencidos.

Lá num canto escuro do estacionamento, ela finalmente libera os garotos. Num e noutro, o semblante de pavor logo se substitui pelo de júbilo. Vão ver o Coringão jogar!!!

Essa generosidade se fazia presente no dia a dia da ex-cartola. Sempre havia alguém que lhe pedia dinheiro para um remédio, passagens para um jogo, uma camisa do Timão, uma roupa qualquer para um batizado.

Como ela não sabia dizer não, sua casa era um ponto de romaria dos necessitados. Como nos contou o Lucca, seu sobrinho-neto, ela tinha sempre a mão aberta e alguns oportunistas até se aproveitavam desse coração solidário, bem no estilo 1910.

Mas Marlene também curtia a boa vida. Adorava viajar, principalmente de navio. No centenário do Timão pagou as passagens de um cruzeiro para várias amigas. Houve uma época em que adorava os bingos, como conta um taxista do metrô Carrão.

Já passa das cinco da tarde quando o carro funerário chega ao cemitério da Quarta Parada. Há muita gente, pessoas comuns, que esperam a chance de se despedir da presidenta.

Na área do velório, destravam a janelinha do esquife, agora nas mãos de um ex-presidente dos Gaviões. Lá está o rosto pálido, mas ainda liso e incrivelmente belo de Marlene.

Há um discurso de um torcedor, bonito e pungente. Um silêncio e depois um pranto coletivo. Aí, vem o hino do Corinthians, cantado por todos.

Sobe-se lentamente a colina do campo santo. Um surdo marca o compasso fúnebre. Ali perto, está sepultado Idário, o Deus da Raça.

Basílio, que ajuda a organizar o sepultamento, ainda manca. No trajeto, olhos marejados, me diz que agora operou, colocou uma prótese.

A perna vergada é a direita, aquela do gol mais importante da história do Corinthians. Digo-lhe que se cuide. Gostamos dele e o queremos com saúde, sempre conosco.

Já é quase noite em São Paulo. Um pássaro canta triste, na distância, o adeus.

Agora, Marlene e Vicente, estão juntos para sempre. Não no frio mármore da tumba, mas na ensolarada arquibancada de cima.

Veja mais em: Fatos marcantes.

Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.

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Por Walter Falceta

Walter Falceta Jr. é paulistano, jornalista, neto de Michelle Antonio Falcetta, pintor e músico do Bom Retiro que aderiu ao Time do Povo em 1910. É membro do Núcleo de Estudos do Corinthians (NECO).

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