O Corinthians não saber se despedir
Opinião de Beatriz Maineti
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A reformulação do Corinthians era um grande sonho - não só para a torcida, que viu o time fazer um péssimo 2023, mas também para a nova diretoria, comandada por Augusto Melo. Durante o período de campanha, Melo disse a plenos pulmões que mudaria tudo o que fosse possível e que iria impor ali o “maior choque de gestão de todos os tempos”. Aos ouvidos do público, a promessa soou como uma música harmoniosa; a realidade, porém, é um show de boteco com um violão sem corda.
Augusto fez muitas promessas antes e depois de ser eleito. Em determinado momento, chegou a dizer que traria 12 reforços para o time do Corinthians, pensando em titulares e reservas. Na vida real, porém, o buraco se mostrou muito mais embaixo. Com pouco poder aquisitivo e com o nome sujo na praça, toda e qualquer negociação para o presidente se tornou uma batalha. Os clubes pediam adiantamentos, garantias em parcelamento e alguns nem quiseram negociar.
Isso, porém, não foi analisado por ele com calma. Entre vendas, perdas e dispensas, Augusto tirou seis jogadores do time titular, e só conseguiu trazer quatro peças para os 11 iniciais. Fora estes, suas contratações buscavam compor elenco, o que também era parte do projeto. A verdade, porém, é que o projeto precisava ter sido feito de forma mais inteligente.
O maior problema neste caso é que, infelizmente, não dependia só do novo presidente. Para conseguir reformular como queria, Augusto precisava ter contado com a colaboração das gestões anteriores, que não fizeram seu papel direito. Com negociações confusas, nomes duvidosos, trocas de técnico a torto e a direito e um departamento de futebol defasado, a Renovação & Transparência entregou um Corinthians sem saída, e Augusto ainda não encontrou o caminho das pedras amarelas.
Montar um elenco de um ano para o outro é difícil. Montar um elenco de um ano para o outro com pouco dinheiro, é ainda pior. E montar um elenco para o Corinthians de um ano para o outro e com pouco dinheiro, beira o impossível. É verdade que Augusto deveria ter pensado melhor antes de assinar tantas dispensas como fez em dezembro de 2023, mas é verdade, também, que o legado que recebeu chega a ser vergonhoso.
A eleição presidencial do Corinthians aconteceu em 25 de outubro de 2023. Na época, o time disputava apenas o Campeonato Brasileiro e brigava contra o rebaixamento. Disso todo mundo sabe. Mas tem um fato que, a olho nu, pode escapar os mais distraídos: quando Augusto Melo recebeu a notícia que seria o novo presidente do Timão depois de ter derrotado seu adversário, o Corinthians tinha acabado de sofrer uma goleada por 5 a 1 para o Bahia, dentro de casa, com basicamente a mesma linha defensiva que era utilizada em 2014: Cássio; Fagner, Gil, Lucas Veríssimo e Fábio Santos. A única mudança era Veríssimo.
Passados dez anos entre uma data e outra, todos os jogadores citados já sentiam o peso da idade. Com a exceção de Cássio, porém, nenhum deles tinha um reserva a altura. Quando chegaram ao Corinthians, o time já era comandado pelo mesmo grupo político que ocupou as salas da diretoria até ano passado, e dois deles (Gil e Fábio Santos) foram contratados e recontratados justamente por estes cartolas. Em momento algum, porém, houve o entendimento de que o elenco precisava de mais e de que era preciso ficar atento ao mercado.
E assim seguiu: entre chegadas e saídas de reservas, técnicos e companheiros, alguns nomes seguiram ali, absolutos. Hoje, porém, a carga fica mais pesada para quem comanda o time. Gil e Fábio Santos deixaram novamente a equipe: o primeiro não teve seu contrato renovado, e o segundo pendurou as chuteiras. Fagner, porém, bateu os 34 anos e nunca viu sua titularidade ameaçada. Agora precisa escolher o setor do campo em que irá atuar, pois seu físico não lhe oferece mais a agilidade que ele um dia teve. Cássio, ídolo inabalável e líder de elenco, sofre com críticas pela baixa impulsão em bolas altas e já sente o cansaço dos 36 anos, sendo a maior parte deles dedicados ao ofício de goleiro.
O Corinthians, desde 2012, não se prepara para substituir seus jogadores, seja por saídas eventuais, aposentadorias ou até porque, de vez em quando, a gente precisa saber quando é hora de desacelerar. E hoje, com uma necessidade aguda de reformulação, o clube não tem a opção de buscar reservas para a maior parte das suas posições; precisa de titulares. Um jogador titular em boa idade e condição física custa caro, e o clube hoje não tem dinheiro para ir ao mercado com tanta força.
Como reformular um elenco que nunca teve reserva para um lateral de 34 anos? Como dizer a um ídolo que é hora de começar a preparar o próximo para assumir o seu lugar?
Se despedir é algo difícil; ninguém realmente está pronto para admitir que ciclos se encerraram. Neste caso, falar é infinitamente mais fácil do que fazer. Mas para que haja uma reformulação é verdade, é por estes casos que devemos começar: é preciso entender que nem tudo dura para sempre, e a ruptura não precisa ser abrupta, feita de um dia para o outro. Ela pode ser gradual e respeitosa, levando adiante o legado deixado por um jogador tão amado pelo clube.
O torcedor que ama e idolatra não quer perder a admiração que sente pelo jogador. Afinal, como uma vez disse o Doutor, “o Corinthians é uma religião, é uma grande nação, mas muito mais do que isso, o Corinthians é uma voz, o Corinthians é uma força, é uma forma de expressão que a sua população tem”, e os jogadores dentro de campo tem papel fundamental em honrar essa representação de amor.
Por isso, é preciso saber deixar ir e aceitar quando chega o momento. Mas, no fim das contas, será que nós estamos preparados para dizer “adeus”? No fim, será que nós, torcedores, realmente sabemos nos despedir?
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.