Na linha do Equador, um momento de encanto
Opinião de Walter Falceta
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Então, ontem, armava-se a repetição do malogro nacional (tão injusto) ocorrido em nosso Parque São Jorge. Muita gente até deu pause na trôpega DAZN, de tanto nervoso, de tanta angústia, ainda mais depois do tento mal anulado.
Gols perdidos e atuação sobrenatural, mais uma vez, da espetacular goleira Luciana, da Ferrinha.
Aí, rasga-se um vão na saída esticada de bola. Tamires enxerga em raio-x as microfendas na malha intrincada do espaço-tempo. Envia a bola ao ponto futuro, improvável, apenas imaginado.
A redonda vara infindáveis nanossistemas solares até apresentar-se quase gentil à zagueira araraquarense. Ah, pensamos, perdeu-se a redonda.
Eis que, no entanto, risca Quito, no meio do mundo, um raio alvinegro, rompendo a física clássica, assustando o espírito de Newton e submetendo a lógica à subversão da garra.
Crivelari antecipa-se à adversária em um décimo de segundo, medida de menos de quatro centímetros, reescreve a reta do sonho e vence a inexpugnável arqueira adversária.
São fenômenos integrados, que unem inteligência rara, técnica apurada e, sobretudo, raça, essa virtude que serve de plataforma à tradição corinthianista.
Alguém afirmou que, se bem observado, o lance lembra aquele que envolve Sheik e Romarinho no gol que decretou o empate diante do Boca Juniors, no primeiro jogo da decisão da Libertadores de 2012.
O desenho do avanço, sim, evoca essa linda reminiscência. No caso das mulheres corinthianas, no entanto, há mais energia no impulso decisivo.
Vê-se no compasso aberto a distância de quilômetros entre um pé e outro de Crivelari; a volição no átimo mágico que se converte em grafia nos cabelos ao vento; o músculo grácil e aqueles do gastrocnêmio exigidos ao máximo da extensão anatômica, o bailado de equilíbrio extremo dos braços (um para o céu e outro para a terra)... E o olhar meio sombreado, perfurante, culmíneo e implacável.
Esta é a alma de Corinthians. Nasceu em 1910, lá na Várzea do Carmo, sob a mirada da lavadeiras do Glicério. De vez quando, reencarna em escolhidxs nos gramados do mundo, toma de encantamento um Basílio, um Guerrero ou uma menina destemida que o destino roubou do ciclismo.
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.