Negociar Cássio pode ser primeiro passo para uma reformulação profunda e necessária
Opinião de Memória Fiel
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Sete de janeiro de 1998 foi um dia estranho para a nação corinthiana, mas, ao mesmo tempo, foi o começo de uma fase mágica de títulos e esquadrões que criaram o “Todo Poderoso Timão”. Naquela quarta-feira, o elenco alvinegro voltou de férias e se reapresentou para começar a temporada sob o comando de um novo técnico: Wanderley Luxemburgo (que ainda usava W e Y!)
Reza a lenda que na porta do vestiário haviam duas listas, uma com os jogadores que deviam viajar para a pré-temporada em Serra Negra (SP), e outra com os dispensados. Nessa segunda lista, estavam simplesmente Ronaldo, Henrique e Neto. Três xodós da torcida que, apesar dos seus altos e baixos, levantaram taças e conquistaram seus lugares na história do Corinthians. Foram liberados para procurar outro time sem explicação e sem cerimônia.
A lista não afetou apenas os ídolos. Dos 35 jogadores do elenco profissional do Corinthians em 1997, 17 foram dispensados logo de cara --com outros tantos saindo ao longo do primeiro semestre. A primeira reação de todo mundo foi acusar Luxemburgo de ser desrespeitoso e de já chegar se comportando como dono do time. “Ele tem esquema com empresário e vai trazer todo mundo da patota dele”, era o comentário geral.
Em dezembro, quando o Corinthians foi campeão brasileiro e começava a desenhar o “melhor meio de campo de todos os tempos” com Vampeta, Rincón, Marcelinho e Ricardinho, ninguém mais se lembrava da lista de dispensas. Luxemburgo mandou tão bem no Corinthians que foi convocado para treinar a Seleção Brasileira e a base do seu time serviu para ganhar tudo em 99 e 2000.
Relembrar esse momento é relevante em 2021, especialmente quando especulações sobre uma eventual saída do goleiro Cássio começam a circular.
Ronaldo, em 1998, apesar de veterano, não era nem de longe um mau goleiro. Muito pelo contrário! Ele continuava a salvar o time em jogos difíceis e se comportava como um líder nato -- usando a braçadeira de capitão ou não. Podia até falhar, mas sempre havia o atenuante de estar jogando em um time bagunçado, sem esquema tático definido e sem uma defesa decente para protegê-lo. Basicamente, a mesma situação de Cássio em 2020/2021.
Por que a saída de um ídolo que ainda está em boa forma pode ser boa então?
A resposta está menos no que acontece em campo e mais no que acontece fora. Jogadores com muito tempo “de casa” tendem a ficar próximos demais da diretoria e longe demais dos outros companheiros de elenco. Prova disso são as repetidas declarações dos medalhões do Corinthians atual dizendo algo do tipo "não tenho que provar mais nada para ninguém", “a torcida precisa respeitar o meu passado” ou “o time precisa se reforçar se quiser melhorar”.
Não precisamos entender as frases literalmente e removê-las do contexto, mas elas mostram que caras como Cássio se acham acima dos demais. E isso é um veneno para qualquer time de futebol. Tão importante quanto ter jogadores qualificados, é ter um elenco unido, em que um corre pelo outro sem individualismo ou patentes. O jogador tem sempre que estar com fome de provar que merece estar no Corinthians - e não achar que está fazendo um favor ao time.
Um time quebrado financeiramente como o atual Corinthians não pode se dar ao luxo de ter estrelas que se julgam acima do bem e do mal. Quando a coisa vai mal, sempre vai sobrar para o técnico, para os jogadores mais jovens, para os recém contratados. Nunca para os “intocáveis”.
Respeito muito a história de Cássio, Fagner, Gil, Fábio Santos e Jô. Também entendo que existe um abismo entre a qualidade dos reforços que chegaram em 1998 e os reforços que podem eventualmente chegar em 2021. Mas os jogadores mais experientes do elenco atual precisam sim provar porque estão no Corinthians a cada minuto que estiverem em campo… e fora dele precisam abraçar a responsabilidade e liderar o time para valer.
Se for para dizer "não tenho mais nada a provar” ou culpar a torcida por criticar demais, melhor dar a vez para alguém que tenha vontade de se doar totalmente pelo clube. Os jogadores passam, mas o Corinthians fica.
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.
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