Advogado propõe mudanças no estatuto do Corinthians inspiradas no Flamengo de Bandeira de Mello
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Por Lucas Faraldo

Eduardo Ferreira, diretor-adjunto; Duílio Monteiro Alves, diretor de futebol; Andrés Sanchez, presidente
Daniel Augusto Jr/Ag. Corinthians
"Este projeto tem o objetivo de constranger os administradores do Corinthians a aderir a práticas sustentáveis do ponto de vista financeiro. Infelizmente, os dados mostram que o endividamento do clube tem crescido em um momento bastante sensível, em que despontam outros clubes que, no passado, criaram mecanismos para impor as práticas aqui defendidas. Espera-se que, com a contribuição dos interessados, a proposta possa ainda ser aprimorada e completada nas suas eventuais lacunas".
É assim que o advogado Roberto Piccelli, torcedor do Corinthians e colunista do Meu Timão, define formalmente seu projeto de mudança de estatuto para o clube do Parque São Jorge. Basicamente trata-se de uma proposta para aumentar a responsabilização sobre os gestores da agremiação: alguém tem de responder por deslizes financeiros e/ou orçamentários.
Em vídeo: entenda a mudança de estatuto à la Flamengo no Corinthians!
A inspiração é o Flamengo presidido por Eduardo Bandeira de Mello entre 2013 e 2018. Foi nessa gestão que o clube rubro-negro passou a controlar melhor os gastos e reduziu em mais de R$ 200 milhões seu endividamento, passando a faturar anualmente valores superiores ao da dívida total. Em resumo: o clube carioca se tornou saudável do ponto de vista financeiro. Não à toa, o atual presidente, Rodolfo Landim, teve como subir o sarrafo nas contratações e montar o "super elenco" campeão do Brasil e da Libertadores na atual temporada.
"O que essas gestões mais recentes do Flamengo fizeram foi passar a ter um controle da dívida, para não comprometer a liquidez. Conseguiram superar problemas que eram recorrentes no clube, como atrasos de salários", pontua Piccelli.
Atualmente, no artigo 36 do estatuto corinthiano, fala-se em privação do associado a "todos os direitos estatutários, sem prejuízo da aplicação de eventual penalidade pela Comissão de Ética e Disciplina" em caso de "falta de indenização dos prejuízos materiais causados ao Corinthians". Os dirigentes do Timão são também associados do clube, cabe ressaltar.
O texto é relativamente vago e fraco, o que ajuda a entender por que o Corinthians nos últimos anos tem aumentado descontroladamente seu envidamento. Conforme relatado em coluna de Danilo Augusto aqui no Meu Timão, aumentaram em 527% as dívidas do clube durante a atual gestão (ver gráfico abaixo) – o grupo Renovação & Transparência comanda o Parque São Jorge e o futebol corinthiano desde o fim de 2007.

Meu Timão
A tendência, aliás, é esse número seguir subindo. Com previsão de fechar 2019 com dívida de R$ 144 milhões somente relativa a essa última temporada, o Corinthians tem sinalizado com investimento pesado para reforçar seu elenco em 2020. Além da multa que terá de ser paga a Fábio Carille pela demissão do mês passado e dos R$ 800 mil mensais prometidos à comissão técnica de Tiago Nunes, o Timão já confirmou a contratação de Luan por quase R$ 23 milhões e também formalizou proposta de R$ 22 milhões por Michael. Há ainda negociações em andamento pelo colombiano Victor Cantillo e pelo ex-corinthiano Sidcley.
"Por mais que o Corinthians esteja buscando bons nomes, a gente tem preocupação, sim, com a parte financeira. O clube deve fechar o ano com déficit recorde e, ainda assim, está gastando bastante", diz Roberto Piccelli, criador do projeto que promete tentar alterar o estatuto. "Difícil olhar pra isso sem pensar no fato de que daqui a um ano tem eleição."
A ideia, entre outras, é reforçar no artigo 36 quais comportamentos resultariam em punição: "Considerar-se-ão passíveis de responsabilização pessoal os atos da diretoria que importem prejuízo ao CORINTHIANS", constaria no estatuto o novo trecho. Na prática: se o Timão registrou prejuízo extraorçamentário de R$ 10 milhões, por exemplo, alguém tem de pagar – em tese, o presidente em exercício. A medida visa evitar o "efeito bola de neve" de aumentar ano após a ano o envidamento com o qual próximos mandatários terão de lidar.

Roberto Piccelli, advogado, corinthiano e colunista do Meu Timão
Divulgação
Há, claro, diversos (e específicos) atos de gestão irregular ou temerária que Piccelli sugere em seu projeto, tais como: deixar de arrecadar receita a que o Corinthians tenha direito; celebrar empréstimos com empresários ou dirigentes que tenham relação com o Corinthians; aumentar ou criar despesa sem especificar em orçamento a fonte de recursos para tal e o impacto que causará nos próximos três exercícios; aumentar despesa com pessoal no último ano de mandato; antecipar receita que não possa ser amortizada até o fim do mandato; atrasar salários; exceder um limite a ser definido de jogadores com vínculo profissional; etc.
Clique aqui e confira o projeto de mudança estatutária do Corinthians na íntegra.
Fazer tal atualização no estatuto depende basicamente de Roberto Piccelli concluir o projeto e encaminhá-lo ao Conselho Deliberativo – o que só deve ser feito após o advogado receber sugestões de torcedores via e-mail ([email protected]) com outras possíveis mudanças que ajudem a aumentar a responsabilização dos gestores. Estão também sendo estudados por Piccelli, por exemplo, incrementar a participação do Fiel Torcedor no dia a dia do clube e até a possibilidade de remuneração de dirigentes.
"(Após a entrega do projeto) O Conselho tem que decidir pela necessidade de submeter uma proposta de mudança do estatuto aos associados. O regimento interno do Conselho não prevê um procedimento muito complicado para aprovar essa proposta de mudança. Na prática, o mais difícil é convencer a maioria do Conselho e, depois, a maioria dos associados", argumenta Piccelli, que segue em fase de estudo junto a seu projeto.

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Rafaela de Oliveira/Meu Timão