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Existe um Tite na teoria, e outro na prática
Juliano Barreto

Jornalista, biógrafo, maloqueiro e sofredor. Entrar no Pacaembu para assistir Corinthians x Novorizontino no Paulista de 93 mudou sua vida para sempre.

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Existe um Tite na teoria, e outro na prática

Coluna do Juliano Barreto

Opinião de Juliano Barreto

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Existe um Tite na teoria, e outro na prática

Tite na Arena Corinthians

Foto: Agência Corinthians

Em matéria de resultados, não se discute o tamanho de Tite no Corinthians. O treinador foi importante não apenas nos êxitos inesquecíveis de 2012, como também foi essencial nas campanhas inspiradas dos Brasileirões de 2004 e de 2015. Sim, faço questão de falar de 2004 porque naquela época, o Corinthians contava com um dos piores elencos de todos os tempos e o técnico se juntou à torcida para salvar na marra o time de um possível rebaixamento.

Foi em 2004 que começou a se criar a identificação entre a Fiel e Tite. Lembro bem de uma noite de frio e chuva fina no Pacaembu quando meio que do nada a torcida lotou o estádio para empurrar o time contra o Internacional. Estávamos no meio da tabela, vivendo sob uma dieta de vitórias magras e empates sem gols, e não foi surpresa que o placar daquela partida tenha sido outro 0 a 0.

O que ficaria marcado ali foi a consolidação do canto “Corinthians minha vida, Corinthians minha história, Corinthians meu amor!”, com direito ao flagrante de Tite repetindo o “mantra” junto da torcida enquanto marcava o ritmo batendo com a mão no telhadinho do banco de reservas. Uma cena discreta, mas que já mostrava a mesma identificação forte entre torcida, técnico e jogadores que anos mais tarde traria a primeira Copa Libertadores para o Parque São Jorge.

Penso que esse é o Tite que habita a mente dos corinthianos. Um cara que entendeu o jeito de ser do corinthiano e pisava em campo (e às vezes até na arquibancada) como um corinthiano. Esse Tite, infelizmente, ficou no passado. Ou melhor, esse Tite do Corinthians só existiu enquanto foi possível ignorar as contradições do treinador.

Quando discursa em entrevistas, Tite exalta palavras como ética, respeito, merecimento e profissionalismo. Quando age, Tite se comporta exatamente igual às outras criaturas do futebol brasileiro que fazem qualquer coisa e se envolvem com qualquer bandido em troca de mais dinheiro.

Ele falava de ética quando, ao lado de dezenas de profissionais do futebol, assinou uma carta aberta pedindo a deposição do então presidente da CBF Marco Polo Del Nero. Meses depois, estava na sede da entidade aos beijos e abraços com o dirigente comprovadamente corrupto que não saia do Brasil com medo de ser preso.

Tite gosta de falar sobre respeito, mas não respeitou o Corinthians quando foi para a Seleção e no meio da temporada de 2016. Além de deixar o time à deriva, sem sequer cogitar acumular as duas funções como outros técnicos já fizeram, o gaúcho levou grande parte da comissão técnica junto com ele.

A insistência em falar de “mérito” e “merecimento” é outra situação que faz pouco sentido. Emerson “Sheik”, assim como Douglas e Jorge Henrique e outros medalhões, aprontava todas e mais um pouco fora de campo em 2013, mas nada era o suficiente para Tite punir ou afastar o jogador - que, aliás, voltaria a ser titular de maneira injustificável na Libertadores de 2015.

Isso sem falar no “mérito” e no “merecimento” de colocar o próprio filho para ser auxiliar do Corinthians e da Seleção, e ainda rebater com arrogância quem apontava o constrangedor nepotismo. Ou então no hábito de misturar religião com futebol, geralmente depois que o time ganha.

Por essas e outras, não me surpreende que o treinador esteja indo para um time dirigido por gente que defende o preconceito contra nordestinos, que atrapalham as investigações do incêndio que matou os meninos no CT, e que forçaram a barra para torcedores irem ao estádio no meio da pandemia.

Tite vai vestir sua ética com as cores de um clube que desde 2011 não começa e termina uma temporada com o mesmo treinador e geralmente humilha os demitidos.

Esnobar o atual Corinthians, falido financeiramente e moralmente, é uma decisão acertada. Nenhum técnico com opções no mercado escolheria um time sem comando, sem dinheiro, sem elenco e sem nenhuma perspectiva de melhora. Nessa, pelo menos, Tite está sendo profissional - isso se for mesmo verdade que as propostas do Corinthians chegaram a ele.

Pouco importa se no passado o Corinthians abriu as portas para o técnico quando ele estava em baixa. Em sua primeira passagem, ele veio do São Caetano. Na segunda, estava esquecido no Oriente Médio depois de trabalhos medíocres no Palmeiras e no Atlético-MG. Na última, passou um ano “estudando” porque pensava que arrumaria emprego na Europa e não arrumou - em situação bastante semelhante com o que aconteceu em 2023.

No final das contas, o Corinthians e os corinthianos têm mais é que se preocupar com uma limpeza profunda na administração do clube do que em reviver o passado. Pode soar como falta de gratidão ou dor de corno, mas a verdade é que o Corinthians fez muito mais por Tite, do que Tite fez pelo Corinthians. E no momento atual, alguém como Tite não tem como fazer grandes coisas pelo Corinthians. O Corinthians precisa se renovar e se organizar como clube antes, para depois poder voltar ao lugar que merece como time.

A saudade que sentimos é de ter uma equipe com condições para contratar e para manter atletas de bom nível. A saudade é de saber que o time vai disputar a Libertadores todo ano até criar casca e levantar a taça. Com essas condições, um técnico competente pode somar experiência e conduzir o time à grandes conquistas. Sem isso, qualquer técnico, incluindo Tite, Mano, Guardiola ou Gordiola, só vai ser mais do mesmo - com a diferença irritante de que o Adenor frequentemente fala uma coisa, mas faz justamente o contrário.

Veja mais em: Tite.

Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.

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